sábado, 20 de dezembro de 2014

EUA e Cuba: Dilma é culpada. O papa é inocente

Julio Severo
A mídia americana, especialmente a Associated Press, deixou claro que a iniciativa do restabelecimento das relações diplomáticas entre EUA e Cubapartiu do Papa Francisco. Não houve, porém, nenhuma revolta generalizada contra o papa. Nada de pedir o impeachment dele. Pelo contrário, pelo fato de que ele foi o originador de tudo, a oposição anticomunista se acalmou ou prefere atacar tudo e todos, menos o originador.
Com Obama ou Dilma, tudo fica tenebroso. Com o papa, tudo fica legal?

De acordo com a Associated Press, o sonho do papa de acabar com o isolamento de Cuba não é de hoje. Em 1998 ele acompanhou o Papa João Paulo II numa visita a Cuba. Da visita, o então bispo Jorge Bergoglio — hoje Papa Francisco — escreveu um livro sobre suas impressões, criticando a atitude de “negar aos indivíduos sua ‘dignidade transcendente’ e colocá-los exclusivamente ao serviço do Estado. Ao mesmo tempo, ele denunciou o embargo dos EUA e o isolamento econômico de Cuba que empobrecia a ilha.”
Mesmo assim, alguns estão colocando o Obama como o grande culpado da normalização das relações entre Cuba e EUA, retratando o papa como alguém que meramente caiu em algum tipo de conto do vigário socialista do Obama. Afinal, quem caiu na lábia de quem? Por que atacar só Obama e proteger o papa?
Nunca fui um defensor do Obama, porém me esforço para defender a verdade. O que os defensores do papa dizem não condiz com a realidade. Segundo a Associated Press, o papa teve a ideia e inspiração de escrever ao Obama e ao Raúl Castro instigando a reaproximação. Depois, o papa teve a ideia e inspiração de abrir o Vaticano para reuniões secretas entre cubanos e americanos para concretizar essa reaproximação.
Mas se crermos na versão dos defensores do papa, a iniciativa foi do Obama e o papa foi somente um coitado que apoiou o Obama.
Esses defensores estão tratando essa questão com a mesma honestidade com que tratam a Inquisição.
Existe alguma razão para essa distorção da realidade?
Por que querem proteger o papa e sua iniciativa?
Imagino que se em vez do papa, fosse a Dilma, haveria revoltas e histeria generalizada. Diriam: “Foi Dilma quem escreveu para Obama e Raúl Castro instigando a reaproximação. Isso é uma conspiração comunista! Vamos fazer protestos contra Dilma! Vamos derrubá-la!”
Por que com Dilma o caso vira conspiração comunista, mas com o papa tudo é suavizado?
Por que tentam esconder ou camuflar a responsabilidade direta do papa na reaproximação dos EUA com Cuba? A quem interessa essa camuflagem?
Por que Dilma e Obama podem ser acusados de conspiração comunista, mas quando o papa entra no jogo, a história muda e o culpado vira inocente?
Se os que se opõem a Obama e Dilma por causa de conspirações comunistas têm um pingo de honestidade deveriam fazer igual oposição à “conspiração comunista papal” entre EUA e Cuba.
Longe de mim imitar Bush, que dias atrás chamou Bill Clinton de ‘irmão.’ Clinton é um notório socialista pró-aborto e pró-homossexualismo. Não estou me fazendo de irmão nem do Obama nem da Dilma.
Contudo, estão tratando o papa como verdadeiro irmão, varrendo para debaixo do tapete questões que se tivessem sido iniciativas da Dilma ou do Obama, seriam consideradas imperdoáveis.
Mas com o envolvimento direto do papa, tudo muda e todas as desculpas, pretextos e estórias são usadas e abusadas para defender o que, no caso da Dilma ou do Obama, seria indefensável. Com Obama ou Dilma, tudo fica tenebroso. Com o papa, tudo fica legal e perdoável?
Se uma grande revolução comunista surgir por iniciativa do Vaticano, com a mesma honestidade culparão o Obama — ou a Dilma.

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