domingo, 20 de dezembro de 2015

A Luz do Natal


"Se o tempo reconta a história da luz que emana da época do natal de diferentes maneiras, a húbris revolucionária também encontra formas diferentes de tentar eclipsar tradições e costumes tão caros ao convívio do homem."

"Enquanto o sábio aponta o céu, o idiota olha o dedo"
– Rosa de Saron

Desde que o mundo é mundo, dezenas de religiões, cultos e ritos tentaram interpretar a realidade última por detrás de cada detalhe da existência. Com o cristianismo não foi diferente. Para muitos, Jesus Cristo encarna a verdade final sobre as maiores questões do homem; para outros, foi apenas um dentre um série de profetas hebreus. 

Este texto não será mais uma tentativa de documentário sobre os segredos do cristianismo, tão comuns nessa época. Quero apontar para algo comum à experiência humana e que é quase impossível de ser notado em meio ao ataque em massa que a história da encarnação sofre todo dezembro: a continuidade milenar da tradição do natal.

Longe de demonizar toda a cultura antiga, na interpretação da Igreja, os ritos antigos possuíam um fundo de veracidade. O paganismo tinha elementos que apontavam para a história cristã. Celebrar o solstício de inverno e o renascimento da colheita, para os primeiros cristãos, era a maneira primitiva com a qual os pagãos falavam da morte e da ressurreição de um Cristo que dava vida a todas as coisas. 

A festa do Sol Invictus, a posição das abóbadas das igrejas, a celebração do Natal, e a construção de Igrejas em locais de adoração pagã é apenas uma das formas que a Igreja encontrou de manter a continuidade com os costumes mais antigos que ela. Muito antes de qualquer autor conservador começar a defender a manutenção dos usos e costumes, os primeiros Pais da Igreja talvez tenham percebido que o máximo que se pode fazer com uma cultura aparentemente hostil, é dar um novo e maior sentido a ela, ou seja, redimi-la, da mesma forma que o Cristo redimia a natureza humana.

As mentes rasas de hoje em dia só enxergam nisso uma nova maneira de dizer que as histórias narradas no Novo Testamento e os costumes da Igreja são apenas recriações de mitos pagãos, assim como comunistas e progressistas insistem em dizer que a cultura proporcionada por séculos de filosofia grega, direito romano e moralidade judaico-cristã são apenas invenções de uma elite preocupada em manter o poder sobre os menos favorecidos. 

Se o tempo reconta a história da luz que emana da época do natal de diferentes maneiras, a húbris revolucionária também encontra formas diferentes de tentar eclipsar tradições e costumes tão caros ao convívio do homem.




"O Cristianismo", escreve Lewis, " é a história de como o rei por direito desembarcou disfarçado em sua terra e nos chama a tomar parte numa grande campanha de sabotagem."







C.S Lewis, G.K Chesterton e J. R.R Tolkien - três das maiores mentes quando o assunto é fantasia literária e mitologia, viam nos mitos antigos de religiões primitivas as "figuras das coisas que haveriam de se cumprir". 

A Lei de Moisés, por exemplo, surgiu centenas de anos após a aurora da humanidade, assim como muito tempo depois, Cristo viria, para os cristãos, a encarnar a verdadeira e única moralidade possível aos homens. 

Lewis, que via na mitologia apenas uma outra forma de falar sobre sentimentos humanos verdadeiros, escreve em O Problema do Sofrimento que o conto da Queda no Éden foi a forma literária mais avançada que os primitivos encontraram de dizer que, após o surgimento do homem como hoje o conhecemos, fizemos escolhas ruins que cada vez mais nos afastaram da felicidade  e nos transformaram nos seres egoístas e necessitados de redenção. 

"O Cristianismo", escreve Lewis, " é a história de como o rei por direito desembarcou disfarçado em sua terra e nos chama a tomar parte numa grande campanha de sabotagem."¹

Somente o fato de três gênios terem pensado o completo oposto do que diz o zeitgeist (espírito da época), já desautoriza qualquer um a pensar e falar o contrário sem antes estudar no mínimo o que estes três estudaram. 

No entanto, como salienta Luiz Felipe Pondé, a modernidade deu ao público leitor de jornais a hegemonia na interpretação dos fatos.³ E como estudar antes para depois falar não é muito popular, na época do natal, pululam as teorias já há muito derrubadas por estudiosos acerca de Jesus Cristo. 

Quem já assistiu um documentário sobre os segredos do Corão, seus mitos, lendas e erros científicos? Quase nenhuma linha é escrita, quase nenhuma reportagem vai ao ar. 

Independente do cristianismo disser a verdade ou não sobre o sentido da vida, seus valores moldaram uma civilização que, até o início da invasão vertical dos revolucionários, vinha dando certo. 

Aí talvez esteja um dos motivos principais pelo qual todo santo dezembro os mesmos ataques sobre a religião cristã preenchem as programações: a Bíblia é cheia de erros, a Dinastia Davi nunca existiu, haviam outros messias além de Jesus, os Evangelhos não foram escritos pelos discípulos de Cristo, Jesus nunca existiu, ou pior: Jesus nunca existiu, mas teve uma esposa - dizem. (kkkkk)

Me interessa muito mais saber as origens dos símbolos natalinos, como a árvore, a troca de presentes, ou o funcionamento dos solstícios e como eles influenciaram as religiões antigas baseadas na agricultura. O fio de continuidade que liga esses eventos ao cristianismo é que me desperta mistério e admiração, como aliás desperta em todo conservador, cristão ou não. 

O Natal, seja para cristãos ou pagãos, permanece emitindo sua luz através dos milênios, despertando mistério entre crentes e não crentes, e convidando os homens a unirem-se em torno de mitos fundadores para levar paz à Terra e aos homens de boa vontade.

1. Lewis, Clive Stapes - Cristianismo Puro e Simples, Martin Fontes (2009)

Fonte: Reaça

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Faça um blogueiro feliz, comente!!
Porém...
Todo comentário que possuir qualquer tipo de ofensa, ataque pessoal e palavrão, será excluído sem aviso prévio!