quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Entrevista com Renato Cunha O conflito entre a heresia cessacionista e o pentecostalismo e o neopentecostalismo no Brasil

Renato Cunha

Julio Severo

No Brasil evangélico majoritariamente pentecostal, falar de pentecostalismo e teologia calvinista parece como falar de dois universos opostos. Mas não para o Pr. Renato Cunha, que tem o grau de bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição, na cidade de São Paulo. Esse é o maior seminário vinculado à Igreja Presbiteriana do Brasil.

Na vivência espiritual do Renato, os dois mundos convivem bem quando seus habitantes focam na Palavra de Deus. É com tal vivência conciliatória de dois mundos sob a Palavra de Deus que ele escreveu o livro “Sob os céus da Escócia: uma análise das profecias dos puritanos escoceses no século 17,” publicado pela Editora Carisma.
Esse livro procura responder às indagações pessoais de presbiterianos, garimpando séculos de historiografia protestante reformada e calvinista, em busca de manifestações do Espírito Santo entre eles. Renato percebeu que havia uma clara contradição entre o testemunho acanhado dos livros teológicos reformados atuais, em relação ao que se verificou entre os escoceses puritanos.
“Sob os céus da Escócia” expõe relatos extraídos de fontes reformadas e calvinistas que atestam um intenso mover do Espírito Santo de Deus entre os escoceses puritanos e ingleses no período compreendido entre os séculos 16 e 18.
Com o crescimento da heresia cessacionista no Brasil, Renato entendeu como imprescindível o estabelecimento de uma editora focada em suprir os cristãos carismáticos e pentecostais com boa literatura teológica sobre a pessoa e obra do Espírito Santo. 
A página de internet dele é: http://www.teologiacarismatica.com.br
Para dar ao público uma ideia melhor do que o Pr. Renato Cunha vem fazendo, entrevistei-o e abaixo estão as perguntas e respostas:
Julio Severo: Há uma guerra espiritual em andamento, tanto para prejudicar os filhos de Deus quanto para impedir as almas perdidas de conhecerem Jesus. Como os dons sobrenaturais do Espírito são úteis nessa guerra?

Pr. Renato Cunha: Eu acho esta pergunta imprescindível. É importante notar que mesmo após terem passado 3 anos aprendendo com Jesus, havia a necessidade de os apóstolos serem revestidos de poder. Sem poder do alto é impossível lutar de maneira eficaz contra o Império das Trevas, contra o pecado estrutural que se enraizou neste mundo tenebroso. A guerra contra o diabo e seus anjos não se desenvolve apenas no plano ético, como a ala conservadora do cristianismo protestante deseja nos fazer crer. 

Ela possui várias frentes, dentre elas a batalha com espíritos demoníacos que atuam produzindo enfermidades, possessões diversas, erros doutrinários, desunião, engano espiritual, etc. Para cada ataque do maligno, Deus providenciou armas para combater. Quando houver erro doutrinário, a compreensão apropriada da verdade revelada de Deus na Bíblia é um antídoto. Foi assim que Jesus lutou contra o diabo no deserto. 

Contra as enfermidades, Deus nos concedeu acesso ao dom de curar. Possessões demoníacas, autoridade sobre espíritos imundos; contra desunião, temos o mandamento do amor, e contra o engano espiritual, o dom de discernir espíritos. Ninguém vencerá o império das trevas apenas por estar afiado com uma teologia sistemática à disposição, na ponta da língua. Quem pensa assim, já perdeu.

Julio Severo: É loucura enviar um soldado sem armas e equipamento militar adequado. Os dons sobrenaturais do Espírito Santo são parte importante do equipamento militar do cristão. Por que alguns cristãos recusam esse equipamento? É certo um soldado recusar o equipamento do seu general?

Pr. Renato Cunha: Os cristãos que recusam esse tipo de equipamento não estão lutando na linha de frente. A maioria deles sequer testemunhou um caso de possessão demoníaca. Por isso eles acham que o diabo se combate com teologia sistemática ou apenas com versículos bíblicos aprendidos na Escola Dominical e no curso de pós-graduação em Bíblia. 

É claro que nem tudo é possessão demoníaca e às vezes é preciso saber o que é e o que não é quando se trata de combater as hostes do mal. Para isto, Deus oferece o dom de discernir espíritos. 

Lembro que Lloyd-Jones mencionou em um de seus livros acerca da visita de uma médium à sua igreja. Ele disse que a médium ficou impressionada acerca do que sentiu quando estava na capela, ao que ela definiu como a presença de espíritos puros, diferente dos que ela tinha costume em lidar. Se uma médium consegue discernir a pureza de espíritos, por que um cristão sincero não seria capaz de fazê-lo com a assistência do Espírito Santo?

Julio Severo: O que é o cessacionismo?

Pr. Renato Cunha: É mais fácil responder o que ele não é. Bíblico, nunca foi. O Dr. Jon Ruthven, um dos pentecostais mais respeitados nos Estados Unidos, assevera que o cessacionismo tem origens num judaísmo remoto inimigo do cristianismo. Jesus foi vítima de um tipo primitivo de cessacionismo judaizante. Veja só, ele foi acusado de desobedecer aos mandamentos prescritos em Deuteronômio 13 e 18 que proíbem a realização de sinal ou maravilha para desencaminhar o povo a seguir falsos deuses. 

Está lá, registrado na Bíblia, mas muitos fazem questão de não enxergar ou empreendem esforços demasiados para desassociar-se desta associação inevitável. Jesus operando as obras do Pai, pelo poder do Espírito, e os fariseus o acusando de ser demônio. 

O cessacionismo faz isso em muitas situações hoje em dia. Basta não entenderem o funcionamento de determinada operação, para ridicularizar e escarnecer rotulando como operação de Satanás. Então, respondendo tua pergunta, o cessacionismo mais rigoroso é este espírito que se mantém redivivo confrontando as obras do Espírito Santo de Jesus, julgando com isso prestar um bom serviço ao Reino de Deus.

Julio Severo: Muitas vezes, há uma percepção de que todos os pentecostais creem nos dons sobrenaturais do Espírito e que os calvinistas e outros protestantes tradicionais não creem. Isso é verdade?

Pr. Renato Cunha: Não, não é. E é preciso que todos tenham conhecimento disso. Mas antes de me ater em uma parte da pergunta, preciso dizer que há muitos irmãos que são pentecostais nominais, aqueles que estão nas igrejas pentecostais porque pertencem a uma tradição, mas nunca tiveram um contato verdadeiro com o poder de Deus. Além do mais, há muita criancice confundida com poder do alto. A rejeição é natural e deve acontecer. 

O que é preciso é rogar ao Senhor que perdoe nossos pecados, sare a nossa terra e desça sobre nós com seu poder genuíno. Por outro lado, há muitos estudiosos reformados de peso que creem firmemente na manifestação dos dons extraordinários do Espírito para os dias de hoje. Wayne Grudem, D. A Carson, Don Codling, Vern Poythress, J.I Packer, John Piper, isso só para mencionar alguns. As teses se arrimam na mais criteriosa exegese bíblica. Mas quantos de nós têm realmente lido estes homens? Lido com a intenção de interagir e aprender a verdade sobre o que a Bíblia diz sobre os dons e não com o propósito de procurar erros. Examinar todas as coisas e reter o que é bom é o mandamento apostólico, e não examinar todas as coisas, descartar as verdades e evidenciar questões secundárias que não resolvem a demanda. 

Este tem sido o procedimento de muitos cessacionistas, como John MacArthur, por exemplo. Sem falar que se fôssemos peneirar os erros de MacArthur, pouca coisa sobraria de útil nos ensinos dele. Por fim, quem conhece as centenas de milhares de manifestações dos dons extraordinários verificados na Escócia e Inglaterra entre os puritanos no decorrer dos séculos 15 a 18? 

Quem as conhece? Os registros estão aí, deixados pela erudição de historiadores calvinistas do mais alto gabarito. Além do mais, homens como Samuel Rutherford e George Gillespie, os dois mais importantes delegados da Assembleia de Westminster eram absolutamente favoráveis à possibilidade de ocorrerem revelações especiais extrabíblicas. Mas quantos reformados no Brasil sabem disso? Quantos já leram essas teses? Quantos já ponderaram criteriosamente sobre o que eles disseram? São perguntas que geralmente ficam sem resposta.

Julio Severo: Outra percepção comum é que pelo fato de que há mais escândalos visíveis entre pastores pentecostais, a invisibilidade de escândalos entre calvinistas cessacionistas parece prova suficiente de que os adeptos do cessacionismo estão certos. O que você diz? 

Pr. Renato Cunha: Quer um exemplo do que acabei de dizer na resposta acima? MacArthur disse, em livro sobre o ministério pastoral, que o pastor deve ser moralmente íntegro, mesmo antes da conversão. No capítulo 5 do livro “O Ministério Pastoral”, ele chega a dizer que Davi, ou Salomão, só poderiam ser reis, mas nunca pastores porque haviam se envolvido em imoralidades sexuais. Disse também que a expressão paulina “marido de uma só mulher”, implica em dizer que não seja apenas casado com uma só mulher, mas que o candidato ao ministério pastoral só poderá ter tido sexualmente uma única mulher na vida. E isso inclui até mesmo seu passado antes da conversão. Defende que se alguém foi chamado por Deus, Deus o preservará neste sentido. 

Ora, este é um absurdo teológico que despreza o poder purificador do sangue de Jesus (o sangue de Jesus não purifica de todo pecado?), que ignora a asseveração apostólica que afirma que após aceitarmos a Cristo tudo se faz novo, e é um incentivo à auto-glorificação farisaica que vê os demais como pecadores imundos. Este tipo de comportamento foi duramente censurado por Jesus ao mencionar a oração do publicano e do fariseu. Sem falar nas implicações disso. 99% dos pastores teriam que abandonar sem demora os ministérios. Segundo os critérios de MacArthur, arrisco dizer que mais de 99% deles não estão aptos para exercer o ministério pastoral. 

Outra implicação é que muitos pastores são protegidos da repercussão dos escândalos. Proporcionalmente falando, há tanto ou até mais escândalos na seara reformada. A questão é que muitos casos são abafados ou sequer confessados, que estão “protegidos” pelas sombras. Agora, cá entre nós: Quer escândalo maior que negar Jesus como Pedro fez? Eu penso que é mais escandaloso que qualquer imoralidade sexual, ou você não acha? Como nós trataríamos Pedro hoje, se nem toleramos traições à nossa denominação, ou às doutrinas que ela defende? O fato é que Cristo restaurou o ministério de Pedro, e isso sim é um duro golpe no diabo. Por quê? Porque a maior derrota para o inferno é o perdão que emana da Cruz.

Julio Severo: Por que tantos pentecostais, especialmente assembleianos, buscam cursos teológicos em instituições calvinistas que desprezam experiências pentecostais? Por que diretores de instituições teológicas assembleianas divulgam calvinistas que atacam o pentecostalismo?

Pr. Renato Cunha: Porque se vendeu a ideia de que calvinismo é sinônimo de verdade mais consistente com a mensagem bíblica. Porque existe muito despreparo na formação de obreiros. Porque há uma agenda editorial comprometida com uma ideologia de massa, disposta a incutir no inconsciente coletivo que tudo aquilo que não for reformado deve ser rejeitado porque não tem profundidade bíblica. 

Porque há muita meninice no pentecostalismo, naturalmente em razão de seu tamanho, visto que são 25 milhões de cristãos pentecostais no Brasil. Quantos crentes são reformados? 10% disso? É natural que as meninices sejam mais evidentes que a imperícia reformada para tratar diversos assuntos.
Julio Severo: Calvinistas cessacionistas pregam que os dons sobrenaturais do Espírito Santo só eram úteis 2.000 anos atrás para escrever os livros canônicos e acusam que os que têm dons hoje querem adicionar novos livros à Bíblia, sendo que eles adquiriram tais posições radicais através de livros teológicos cessacionistas que, na prática, eles tratam como verdadeiras adições à Bíblia. O que você pensa dessa discrepância?
Pr. Renato Cunha: São vários os erros reformados na elaboração das teses cessacionistas. A questão é que eles não são evidenciados. O cessacionismo diz, por exemplo, que os dons de profecia e línguas foram úteis naqueles dias em razão do período fundacional da Igreja. Mas nós encontramos o dom de profecia muito distante do período fundacional. Tome o AT como exemplo. Elias estava vivendo o período fundacional? Eliseu, Micaías, Jeremias, também? Além do mais, o exorcista de Mc 9:38-41 é um dos personagens a indicar que as operações sobrenaturais estavam além dos limites do colégio apostólico. 

A resposta de Jesus sinaliza isso. Outro erro é dizer que o batismo com o Espírito Santo acontecia exclusivamente pela imposição de mãos de algum apóstolo. Ora, se isso é verdade, o que devemos dizer da afirmação do apostolo Paulo de que havia batizado apenas alguns poucos na Igreja de Corinto? E ele chega a dar graças a Deus por isso. 

Se isso é verdade, e como verificamos os dons sendo derramados em profusão, fica difícil crer que os dons de todos naquelas igrejas do primeiro século receberam dons exclusivamente pela imposição de mãos dos apóstolos. Então como posso restringir a manifestação dos dons ao período fundacional da Igreja quando a própria Bíblia indica claramente que esta tese é um erro teológico dos mais sérios?

Julio Severo: Os calvinistas cessacionistas acusam cristãos pentecostais de colocarem suas experiências com o Espírito Santo acima da Bíblia. Mas eles parecem não enxergar que eles colocam sua experiência de ausência dessas experiências e dons acima da Bíblia. Qual é, afinal, a experiência que tem se colocado acima da Bíblia, a experiência pentecostal ou a experiência cessacionista?

Pr. Renato Cunha: Bem, o que posso dizer sobre isso é o seguinte: O cessacionismo é uma elaboração que se vale quase que integralmente de pressupostos extrabíblicos para confundir e nos fazer crer que os dons estavam definidos para cessar quando a Bíblia fosse completada e o último dos apóstolos estivesse, morto. Além do mais, esta doutrina despreza o princípio da graça de Deus, que tem prazer em nos abençoar com mais do que precisamos ou seja suficiente. 

Então porque a Bíblia é suficiente para nos dirigir na maioria das situações da vida, Deus não pode revelar algum pensamento ou direção em particular a um filho seu, sem a instrumentalidade do texto bíblico? Esta é a questão. Se Deus não puder fazer isso além dos limites da Bíblia, esse deus não é o Deus das Escrituras. Seria o grande relojoeiro das formulações científicas contrárias à fé.

Julio Severo: Um famoso pastor presbiteriano, que é conhecido como o apóstolo do cessacionismo no Brasil, ataca a posição de “apóstolo” para os dias atuais, mas ele ocupa uma posição de incriticabilidade total em sua denominação, sendo tratado como se fosse acima de apóstolos, profetas e escritores da Bíblia. O que você acha dessa idolatria por parte de quem critica idolatria eclesiástica em outros quintais denominacionais?

Pr. Renato Cunha: Ela é nociva, certamente está suscitando a ira de Deus e causa sérios prejuízos espirituais para todos os envolvidos. O Senhor não permitirá isso por muito tempo porque ele é zeloso e não divide sua glória com ninguém. Anotem esta profecia e julguem-na como convém: Se não houver arrependimento genuíno (e eu oro para que haja), o cálice da ira do Senhor irá transbordar em breve. O aniversário dos 500 anos de Reforma será celebrado com luto por muitos neste país. 

Julio Severo: Um líder evangélico me contou tempos atrás que, pelo fato de que eles fazem teologia em instituições calvinistas ou são influenciados por professores assembleianos calvinizados, há pastores assembleianos que concordam com o cessacionismo, mas se mantêm calados. Você acredita que esses assembleianos influenciados poderão futuramente trazer o cessacionismo para suas igrejas ou levar suas igrejas a adotar oficialmente o cessacionismo?

Pr. Renato Cunha: O assembleiano cessacionista é uma contradição semântica, filosófica e ética. Não existe espaço para um pentecostal ser cessacionista, assim como o inverso também é verdadeiro. É confusão no arraial do Senhor, e Deus é de paz, não de confusão. Mas eu não acredito que esses infiltrados serão capazes de levar a Assembleia de Deus rumo ao cessacionismo. O mover do Espírito entre os carismáticos e pentecostais, assim como o avanço do movimento no país, ninguém pode deter; é obra santa.

Julio Severo: Por que estamos vendo uma militância cessacionista no Brasil?

Pr. Renato Cunha: Porque lidar com as coisas do Espírito envolve intimidade com Deus no cultivo incessante de uma vida fervorosa de oração. Mas quantos de nós oramos 1 ou 2 horas todos os dias? Não estou falando de seguir o exemplo de John Welsh, John Knox, William Seymour, que oravam 7 ou 8 horas diariamente. Estou sendo menos exigente. 

A gente estuda 7 ou 8 horas quando quer passar no concurso público, por meses a fio, mas orar no mesmo ritmo, não? Jesus disse que onde estivesse nosso tesouro, ali estaria nosso coração. Será que as pessoas não se dão conta disso? Será que a certificação como Funcionário Público Federal será de alguma valia no dia do Juízo? Quantos de nós efetivamente sentem prazer em estar na presença do Senhor e busca isso como a corça suspira pelas águas? 

A maioria fala dos neopentecostais e das barganhas com Deus, mas é o que muitos de nós fazemos todos os dias. A gente barganha com Deus, diariamente. Oferecemos o que sobra de nosso tempo e prestamos uma adoração manca, muitas vezes com as mãos manchadas de sangue num culto formal e hipócrita. Isso é ser bíblico? É ser "melhor" que os neopentecostais? Não, isso é farisaísmo.

Julio Severo: Nos Estados Unidos a principal oposição ao cessacionismo é feita por calvinistas renovados, inclusive Wayne Grudem, Jack Deere, John Wimber e outros. Por que há poucos calvinistas no Brasil que assumem uma luta contra o cessacionismo?

Pr. Renato Cunha: Porque se estabeleceu um consenso que este assunto é secundário. Que não é essencial à fé. Daí eu sempre pergunto: Qual o único pecado imperdoável? O pecado contra o Espírito, diz a Bíblia. E o que é este pecado? Basicamente, atribuir ao diabo uma obra que é do Espírito Santo, como os fariseus fizeram em diversas ocasiões. E é o que muitos cessacionistas, por não entenderem algumas operações, fazem hoje em dia. 

Eu penso que quando Jesus indica este perigo, não é para afirmar que a pneumatologia do Reino de Deus é algo secundário. Em absoluto. É essencial à fé e condenará muitos ao fogo inextinguível. É preciso entender também que por mais que tivéssemos o sangue do Cordeiro vertido no Calvário, sem a operação do Espírito, não teríamos um único crente na face da terra. Então como os assuntos que envolvem seu ser e operações podem ser secundários? Eu não sei como. 

Julio Severo: Tive muito contato com a literatura de Wayne Grudem, Jack Deere, John Wimber e outros. Isso me ajudou a enfrentar diretamente a teologia cessacionista. O que fazer para tornar a literatura de Wayne Grudem, Jack Deere, John Wimber e outros acessível no Brasil?

Pr. Renato Cunha: Nós já arregaçamos as mangas e estamos suando a camisa trabalhando. Por isso surgiu a ideia de fundarmos a Editora Carisma e o site Teologia Carismática. Ambos procuram disseminar muita literatura que o crente brasileiro nunca sequer imaginou que existe. Por exemplo, temos lá um artigo do Dr. Ned Stonehouse que fala sobre o batismo e os dons do Espírito Santo. Stonehouse foi um dos fundadores do Westminster Seminary. O artigo dele é um clássico, mas desde 1960 estava inacessível aos que não leem no idioma inglês. Resolvemos isso e está disponível no Teologia Carismática que pode ser acessado pelo www.teologiacarismatica.com.br

Anota aí, senão você esquece. Tem outro artigo, do Grudem, falando sobre o dom de profecia e línguas como sinais da benção e presença de Deus em meio ao seu povo, incluindo nós, hoje. A editora Carisma está para lançar 20 livros entre 2017 e 2018. Teologia pentecostal e carismática com a mais alta qualificação acadêmica. On the Cessation of the Charismata — que no Brasil terá o título “Sobre a Cessação dos Charismata”, por exemplo, do Dr Jon Ruthven é um desses livros. 

Ele simplesmente destrói cada um dos argumentos de BB Warfield, pai do cessacionismo como defendido hoje no Brasil. É pentecostalismo sério, denso, academicamente refinado, e que foi digno do aplauso de homens como Allister MacGrath. MacGrath, a propósito, mencionou o livro de Ruthven em seu livro Christianity Dangerous Idea: A History from the Sixteenth Century to the Twenty-First. Ele disse que era o melhor estudo, a melhor refutação sobre o livro de Warfield. 

Está lá, na página 519, disponível para quem quiser comprovar. Carver T. Yu, por sua vez, disse que Ruthven mostra de forma convincente a incoerência do argumento de Warfield, bem como os vários problemas em sua exegese bíblica. Mas o brasileiro assume teologias como as de Warfield como a cereja do bolo, intocável, higidamente “apostólica,” imune, e contra a qual não se deve apresentar objeções. E o faz, irresponsavelmente, sem ouvir vozes como as de Ruthven. 

Por quê? Sob os céus da Escócia também, de minha autoria, relata manifestações poderosas de Deus entre os puritanos escoceses, que muitos desconhecem. Até um caso de Calvino experimentando o dom de profecia preditiva, registrado e publicado por Beza eu informo no livro. Todas as menções extraídas de fontes reformadas e calvinistas dos séculos 15 a 18. Os puritanos escoceses são a prova de que crer em profecias pós-bíblicas não é coisa de pentecostal iletrado não. Mas a pergunta é: Quem realmente deseja conhecer estas verdades?

Julio Severo: O que um calvinista precisa fazer para se libertar da heresia cessacionista? O que um pentecostal precisa fazer para, ansioso por fazer teologia em instituições calvinistas, evitar a influência da heresia cessacionista?

Pr. Renato Cunha: Em primeiro lugar pedir a Deus sabedoria e entendimento. A Bíblia diz que ele dá e em nada nos impropera. Em segundo lugar, decidir estudar o assunto a fundo, tendo em mente que o princípio do Sola Scriptura é normativo e representa nossa melhor declaração acerca da responsabilidade de examinar criteriosamente a plena revelação de Deus sobre os seus dons. 

O debate deve ter como pressuposto básico que em matéria de doutrina a Bíblia é quem estabelece os termos, e não nossas experiências. O que acontece comigo, pode não acontecer com todos em todas as igrejas. A experiência não é, em linhas gerais, um princípio normativo, como o êxtase de Pedro ou ir ao terceiro céu como Paulo também não foram. É certo que essas situações estão disponíveis a todos? Não! Podem acontecer conosco hoje? Creio que sim. Mas quem pode garantir que acontecerão, se nem Paulo, Pedro ou qualquer outro escritor da Bíblia assistido pelo Espírito, garantiu que aconteceriam?

Penso que ler o livro Sola Scriptura e os Dons de Revelação, do Don Codling é um segundo passo. O livro é excelente, didático e trata-se da Dissertação de Mestrado de Codling no Westminster Theological Seminary. Ele é um presbiteriano canadense conservador, que enxergou diversas falhas estruturais na hipótese cessacionista. 

Acho que este livro deve ser considerado com atenção pelos que desejam tomar uma posição consciente, sobretudo porque nunca foi refutado nos Estados Unidos, nem pelos professores que o examinaram na Banca. Carver T. Yu disse que é muito fácil rejeitar os carismáticos como instáveis e desprovidos de fundamentos bíblicos, e que é opostamente muito difícil nos abrirmos e ver que a nossa própria interpretação da Bíblia nem sempre é imparcial. Quantos cessacionistas têm tido a honestidade para admitir isso?

Quanto à segunda pergunta, penso que os pentecostais que se matriculam em seminários cessacionistas devem estar conscientes de suas responsabilidades no Reino, e não devem se acovardar ou transigir com a teologia de homens como MacArthur. 

Nós carismáticos e pentecostais temos problemas internos a resolver sim, mas isso não nos descredencia. Nós temos excelentes representantes na teologia e Deus nos guiará pelos debates em defesa da verdade bíblica sobre os dons. Devem estudar a Bíblia muito mais do que já estudavam, para estarem prontos a responder as razões de sua fé. A fé carismática e pentecostal possui sólidos fundamentos bíblicos e é preciso aprender com precisão quais são eles. 

Devem aproveitar essas oportunidades para dialogar com respeito às diferenças e saber, sobretudo, que é o Espírito quem convence do erro. Sem a assistência do Espírito, de nada adiantará articular as melhores teses em favor da contemporaneidade dos dons extraordinários do Espírito. Não queremos cessacionistas convictos de seu erro teológico, mas não absolutamente convencidos de que devem buscar com zelo os melhores dons. Quais são estes dons? Paulo responde. 

Então, porque muitos insistem na desobediência flagrante? Depois perguntam por que tarda a avivamento. Viver de avivamentos literários, não é, nem nunca foi o plano de Deus para sua Igreja. 

É desejo dele se derramar com poder, a fim de que proclamemos o evangelho não em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder. Este é o nosso modelo. Devemos imitar a Paulo, porque Paulo imitou a Cristo. O que estamos esperando?

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