quinta-feira, 30 de março de 2017

Gramsci devedor de Descartes


Por Fabio Blanco

Sem dúvida, Gramsci obteve mais sucesso de que seus irmãos revolucionários. Enquanto estes, apesar de tomarem rapidamente o poder e até permanecerem nele por um bom tempo, viram ruir suas conquistas, com um castelo de cartas destruído por um sopro, o gramscismo permanece em sua lenta e gradual marcha pela hegemonia cultural e política, fortalecendo-se a cada dia, sedimentando cada vez mais suas bases.

Se destruir o comunismo fora uma questão de força e inteligência, acabar com a mentalidade formada por décadas de aplicação do método gramscista é algo bem mais complicado, pois envolve a capacidade de penetração na alma humana e alteração de suas visões e até percepções.

Mas Gramsci não obteria nada sem que já não houvesse, na mentalidade da sociedade, algum tipo de veneno, que servisse como preparador do espírito humano para recebê-lo. E tal foi ministrado, ainda no século XVII, por Descartes, que o mundo Ocidental moderno reconheceu como um pai.

Foi o pensador francês que, ao colocar o indivíduo, em sua subjetividade, em posição de vantagem em relação às conquistas coletivas da humanidade, na busca da verdade, ainda que tivesse a intenção de prepará-lo para o conhecimento, serviu mais para deixá-lo exposto à manipulação de quem soubesse entender a fraqueza do ser humano.

E parece até que Gramsci guardou a lição de Descartes, que chegou a escrever que não seria razoável que um partido tencionasse reformar um estado, mudando-o em tudo desde os alicerces e derrubando-o para em seguida reerguê-lo; nem tampouco reformar o corpo das ciências ou a ordem estabelecida nas escolas para ensiná-las (...) O melhor a fazer seria (...) retirar-lhes essa confiança, para substituí-las em seguida ou por outras melhores, ou então pelas mesmas, após havê-las ajustadas ao nível da razão.

E quem pode negar que a mais eficiente ação gramscista não foi mesmo minar a confiança que as pessoas possuíam em suas tradições, costumes e até em suas próprias percepções naturais, para depois insuflar nelas suas loucuras ideológicas? Ela, aos poucos, abalou tudo, porém, não oferecendo aquilo que, idealmente, Descartes pretendia, que era um suposto ajuste do pensamento à boa razão, mas, sim, deixando as pessoas abandonadas, à mercê de qualquer coisa que se lhes oferecesse como solução para o vácuo deixado.

Foi, então, nessa brecha aberta que começaram a passar as novas ideias, que, contudo, não passavam das mesmas velhas ideologias, apenas travestidas de novidade. Foi, assim, que Gramsci parece ter vencido, porém não sem ter de devotar a Descartes o louvor por ter preparado a alma humana para recebê-lo.

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