Unico SENHOR E SALVADOR

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terça-feira, 18 de outubro de 2016

Sadhu Sundar Singh, o apóstolo dos pés sangrentos


Rampur, cidade da índia. É noite. Entre elevadas montanhas cobertas por verdejantes florestas, na planície estende-se a cidade. 

O vento que distante sopra sobre a face azul dos lagos suaviza ali as noites quentes de verão. Mas no inverno a chuva precipita-se generosamente sobre as árvores, as ruas, os telhados, tudo.

Naquela noite em Rampur, o frio era intenso. Reunido com um grupo de criados no pátio de sua mansão, ao redor de um pequeno fogo, o sardar Sher Singh conversava. Absorto, não percebia que na penumbra dois olhos escuros resplandeciam, contemplando-o. 

Era Sundar Singh, seu filho mais novo. Súbito, todos se voltaram.

Destruindo a Bíblia dos Cristãos

Com os olhos fixos nas labaredas do fogo, o moço aproximou-se lentamente. Trazia nas mãos um livro. Quando se avizinhou de todos, furiosamente pôs-se a arrancar as páginas do livro e a arremessá-las nas chamas, bradando:

- Assim e assim destruo o livro dos estrangeiros, o livro de ensinamentos perversos que eles procuram obrigar-nos a aceitar. Odeio a todos eles.
A face amorenada do sardar, cuja nobre cabeça achava-se envolta por um turbante vermelho, foi tomada de ligeira contrariedade. Mas, não saindo de sua majestosa mansidão, fitou os olhos brilhantes e escuros do filho, semelhantes aos seus, e perguntou:

- Que está fazendo, meu filho?

- Estou queimando a Bíblia dos estrangeiros. Eles estão procurando fazer-me cristão, mas eu nunca o serei.

- Sundar Singh - replicou o pai, - isto é uma loucura. A Bíblia é um bom livro e os estrangeiros são bondosos, apesar de sua religião não ser a mesma que a nossa. Veja como eles lhe ensinam tão bem na escola!

- Eles me mandam ler a história do seu Cristo. Eu não quero. - Não é a nossa religião Sik a melhor do mundo? Não estão os nossos livros sagrados cheios dos mais retos ensinamentos? Não somos nós o povo mais antigo da Índia? Como ousam esses cristãos induzir-nos a sermos infiéis aos ensinamentos dos nossos antepassados?


O filho do governador


Sher Singh era o governador de um dos três principais estados siks, da religião de Putiala, na Índia, cujo distrito tinha como centro Rampur.

Era de Rampur que o sardar governava um território de um milhão e meio de habitantes, cujo solo era constituído, em sua grande parte, de planícies cultivadas que se estendiam até as montanhas de Simla.

Foi nas dependências de sua mansão, entre jardins onde desabrochavam as mais belas flores da Índia Setentrional que, em 3 de setembro de 1889, nasceu Sundar Singh, o seu terceiro e último filho.

A mãe de Sundar Singh desde cedo procurou incutir no filho o sentido de religiosidade. Ensinou-lhe as orações que deveria fazer ao levantar-se, ao meio-dia, antes de dormir e nos momentos difíceis.

Lia para ele trechos do Gita, e quando ia visitar o velho sadu do bosque próximo, levava-o consigo. Assim cresceu Sundar Singh, nesse clima de intensa religiosidade. Aos sete anos sabia o Gita de cor. E muitas vezes, já adolescente, seu pai o surpreendia na madrugada, curvado junto à lâmpada de óleo, lendo, no silêncio da casa adormecida.

Diferente de seus dois irmãos, Sundar Singh não nascera com qualquer aptidão para a vida pública, e isso preocupava seriamente seu pai.

Ao contrário de sua mulher, que diariamente ia ao Gurdvara – templo sik - e se demorava mais em suas orações do que em qualquer outra atividade, o sardar era um homem prático, dedicado às coisas práticas.


Sua intenção era preparar os filhos para que o substituíssem no governo de Putiala. Mas Sundar Singh era anti-social ao extremo. Isolado sempre, empalidecia lendo e meditando muito.

"SENHOR, tenho sede de ti!"


- Meninos de sua idade só pensam em brincar e se divertir! – disse-lhe seu pai certa vez. - 
Como é possível ser tão dominado pela mania de religião?

Mais tarde você terá tempo de sobra para pensar nisso. Sundar Singh permanecia calado. Seu irmão mais velho o criticava, apoiando o pai, e dizia: "Ele deve ter pegado essa mania da mamãe ou do velho sadu".

A mãe de Sundar era a única que o compreendia. Em suas orações sempre pedia que o seu filho mais novo permanecesse profundamente religioso.

Aos 14 anos de idade, uma ocorrência dolorosa fez Sundar Singh mais silencioso ainda: a morte de sua mãe encheu-o de amargura e o deixou duvidoso até da existência de Deus. Passou a visitar com mais frequência o bosque, para ouvir as palavras do sadu.

Mas a cada dia suas dúvidas aumentavam, sua revolta crescia, e o velho filósofo do bosque nada podia fazer por ele. Aos 15 anos já conhecia o Granth dos siks, o Corão, e cerca de 52 Upanishads. Mas não tinha paz.

- "Nem um instante penso viver sem ti, Senhor! Tenho tudo quando me sinto perto de ti, porque tu, Senhor, és o meu tesouro! Suspiro por ti, oh! Senhor! Tenho sede de ti. Somente em ti meu coração descansa".

Essas palavras lidas nos velhos livros, falavam de uma paz imperecível. Mas Sundar Singh não sabia onde encontrá-la.

- Meu filho, não percas tempo agora com estas coisas. Mais tarde conseguirás entendê-las; mais tarde... - dizia-lhe o velho Sher Singh.

"Não quero ler nada sobre o DEUS dos Cristãos"

Em Rampur havia uma missão americana onde funcionava a Escola Presbiteriana. Dizia-se que os mestres da missão ensinavam bem. Não era aconselhável que um sik mantivesse contato com cristãos, porém, já que na cidade não havia escola melhor, o sardar resolvera matricular seu filho ali.

No primeiro dia de aula, após sentar-se no lugar que lhe indicaram, a primeira coisa que a professora deu a Sundar para ler foi o Novo Testamento.

Sundar Singh leu em silêncio o ponto assinalado: "Pai nosso que estás no céu, santificado seja o teu nome..." Parou. Avançou rapidamente mais algumas linhas e viu o nome de Cristo. Era o livro dos cristãos! Olhou com ódio para a professora e empurrou o Novo Testamento para longe, temendo o contato.

- Leia - insistiu a professora.

- Por que o leria? Sou um sik e o meu livro sagrado é o Granth.

- Mas o que quero não é fazê-lo cristão. Você pode ler o Novo Testamento e continuar sendo um sik. Porém o regulamento desta escola exige que o livro-texto seja este.

Sundar saiu da sala de aula imediatamente. Quando o seu pai soube do caso, simplesmente deu-lhe dinheiro e o obrigou a comprar uma Bíblia. No outro dia, estava ele na sala de aula, pronto para acompanhar a leitura.

Mas a partir desse dia começou a odiar os cristãos. Zombava da Bíblia, não ia à aula, perseguia os colegas crentes, apedrejava as reuniões ao ar livre.

Visitado por JESUS


Todas estas reações culminaram naquele ato de rebeldia, quando diante de seu pai, furiosamente despedaçou a Bíblia e lançou suas páginas ao fogo.

Naquela noite de rigoroso inverno, ele se trancou em seu quarto, disposto a saber quem era aquele Cristo de quem tanto falavam, se existia realmente ou não. Se não obtivesse resposta, se suicidaria.

Já eram passados quase três dias, Sundar estava dobrado no chão, o rosto repousado no assoalho, quando uma voz lhe falou em perfeito hindustani:

- "Até quando me perseguirás? Eu vim para salvar-te. Oras para conhecer o Caminho. Por que não me segues?"


Sundar ergueu o rosto e olhou em volta, assustado, e murmurou:

- "Jesus Cristo não está morto, mas vive; Ele está aqui. Eu ouvi a sua voz! Eu ouvi a sua voz!"

É o próprio Sundar quem conta: "Caí aos seus pés e senti essa paz maravilhosa que não havia encontrado em outro lugar. Era essa paz que eu buscava. Aquilo era o próprio Céu! Quando me levantei, a visão tinha desaparecido, mas a paz e a alegria permaneceram comigo para sempre."

Quando saiu do quarto e contou o ocorrido a seus irmãos, eles o criticaram furiosamente:

- Estás louco. Que blasfêmia!
Mas o pai lhe disse com calma:

- Meu filho, tu não podes estar pensando nisso. Talvez estejas um pouco febril e tenhas sonhado. Há poucos dias destruíste uma Bíblia e juraste que odiavas os cristãos. Descansa, e isto logo passará.

- Eu não estou louco nem sonhei, meu pai - respondeu Sundar firmemente. - Fui louco, louco por ter lutado tão rudemente contra os ensinos de Jesus! Louco por pensar que tinha de procurar e achar Deus, quando em todo esse tempo Ele estava me procurando.

- Silêncio! - disse o sardar severamente. - Retira-te, não queremos mais ouvir isso.

- Meu pai, eu o obedecerei em tudo, exceto nisto!

- Retira-te! já disse. Ele curvou-se e saiu. O sardar comentou com os dois filhos:

- Isto passará. É apenas um delírio. Ele tem sido fiel à nossa religião e não a trocará por outra!


Expulso da família por não negar a CRISTO

Mas o velho Sher Singh estava enganado. Seu filho cada dia se mostrava mais fervoroso, orando muito, lendo a Bíblia, falando do amor de Jesus dentro de casa, nas ruas, a qualquer pessoa que encontrasse.

O sardar reuniu então a família, e em presença de todos tentou obrigar Sundar a desistir de tudo aquilo que o havia modificado ultimamente.

Fez- lhe belas promessas, ofereceu-lhe dinheiro. Um tio riquíssimo, presente à reunião, prometeu-lhe que o faria seu herdeiro universal, caso Sundar Singh negasse aquele Jesus Cristo tão adverso à religião sik. Mas Sundar, diante da perplexidade de todos, respondeu:

- Eu não posso rejeitá-lo. Seguirei a Cristo por onde Ele me conduzir.

A ira incendiou a face de Sher Singh. E sob o silêncio de todos, o sardar falou:

- Pois eu, neste momento, em nome dos siks, em nome da família, destituo-te do meu testamento, declaro-te maldito, e proíbo-te de continuares mais um minuto que seja em nossa presença e sob este teto!

Em treinamento na escola da morte e da vida

Antes de deixar a casa, Sundar Sing pegou sua Bíblia, algumas frutas e saiu para enfrentar os rigores da noite. Procurou, depois de andar algumas horas, um abrigo onde pudesse descansar.

Só encontrou uma árvore. Ali acomodou-se como pôde e adormeceu. Pela madrugada acordou sentindo dores insuportáveis no estômago. As frutas que comera! Eles as haviam envenenado! Preferiam matá-lo a vê-lo manchar o nome da família.

Com dificuldade, levantou-se. Apesar do frio intensíssimo, um calor queimava-lhe o rosto e calafrios percorriam-lhe todo o corpo. Precisava chegar à missão americana.

Eles tinham medicamentos e o ajudariam. Tentou andar, caiu; levantou-se e saiu cambaleando novamente. Quando caiu inconsciente à soleira da porta da missão, não viu que quatro mãos cristãs o levaram para dentro.

Três anos depois, Sundar Singh era um jovem alto, majestoso, de barba escura e olhos admiráveis. Estudara durante esse tempo na escola da missão. Naquele momento conversava com o diretor:

- Irei para o meu próprio povo. Vestirei um hábito de sadu (em hindi significa puro, reto), e sairei, como o meu Mestre fez, pregando o Evangelho em todas as cidades e vilas. Ao ver-me nesses trajes eles sentirão que lhes pertenço, que sou justamente um deles, e estarão mais prontos a escutar- me do que se eu usar um casaco preto, um colarinho duro e sapatos.

Missionário entre o seu povo

E assim, usando hábito de sadu indiano, e com os pés descalços, Sundar Singh caminhou para Rampur. Quando Sher Singh soube que seu filho pregava na praça, diante de um ajuntamento de curiosos, correu para vê-lo.

Mas Sundar Singh já desaparecera, rumo à aldeia seguinte. Apenas pôde distinguir as marcas dos pés de seu filho, curiosamente impressas no pó. Era fácil identificá-las. Estranhos sinais escuros as diferenciavam das outras. Olhou com cuidado: os pés de seu filho sangravam!

Sundar Singh atravessou todo o Pun-jab, caminhou através das montanhas de Cachemir, atravessou florestas, cruzou o Beluquistão, dormiu em cabanas de pastores e atingiu Jallallabd, sempre falando de Jesus Cristo, o seu Mestre e Salvador.

Cruzou o Indus, viu as planícies de arrozais sem fim, penetrou em Putiala e foi deter-se em Kotgar. Depois rumou para o Himalaia.

Envoltos em nuvens, sob neves eternas e cobertos de gelo, os picos do Himalaia erguem-se para o céu. Bancos de neve ocultam precipícios e vales profundos.

Soprando sobre florestas de ciprestes e coníferas, o intenso vento fere como a ponta de um chicote. Há riscos constantes e tremendos nas subidas das serras; serras tão íngremes que muitas vezes forçavam Sundar Singh a caminhar lentamente, apoiando-se nas encostas para não cair; as mãos dormentes de frio, os pés sangrando.

Há gargantas abissais que se abrem para tragar o viajante, e o perigo do sono sobre a neve. O Himalaia foi o maior desafio na vida de Sundar Singh, pois, para além de suas montanhas de gelo, o budismo domina o Tibete, e naquele país, os lamas são autoridades absolutas e não admitem que forasteiro algum fale de outra religião em seu território.

Mas Sundar Singh foi, mas Sundar Singh cruzou o Himalaia, chegou ao Tibete, levou Cristo a cada cidade, a cada povoado, de aldeia em aldeia, de cabana em cabana; falou de Cristo até ao próprio Lama.

Foi preso, passou três dias no "vale da sombra da morte". Alguém o libertou misteriosamente e ele continuou a pregar. Levado novamente à presença do Lama, foi ameaçado de morte e expulso. Saiu de Tibete, mas saiu pregando, sempre pregando, falando do amor de Jesus Cristo e prometendo voltar.

Ultrapassando fronteiras para anunciar a Salvação oferecida por JESUS CRISTO

Certa vez passou dez dias em total jejum, orando. Encontraram-no inconsciente. Socorreram-no. Mas a partir daquele dia, o poder do Espírito Santo desceu sobre ele e o induziu a pregar em todas as igrejas do mundo.

A Igreja do Sul da Índia o convidou. Ele foi e chegou a falar para 32 mil pessoas de uma só vez. De lá foi à Birmânia. Da Birmânia subiu à China. Da China passou ao Japão.

A Igreja do Ocidente queria ouvi-lo. Ele visitou- a. Foi à Inglaterra e depois à Holanda. Em Haia a elite cultural o ouviupregar. Em Estocolmo hospedou-o o príncipe Oscar, irmão do rei. Todos queriam vê-lo e ouvi-lo. Tornara-se uma personalidade mundialmente famosa. Chegou a pregar para duzentos pastores em um só culto.

O homem que parecia com JESUS

Sua bondade, suas vestes longas, sua face amorenada, seus olhos brilhantes faziam-no parecer o próprio Jesus em visita a todas as igrejas do mundo.

Certa vez, na Inglaterra, prometeu visitar uma senhora, esposa de um homem ilustre. À hora marcada tocou a campainha da casa onde o esperavam. Atendeu-o uma empregada, vinda poucos dias antes da aldeia. O sadu deu seu nome e ela correu à patroa:

- Lá fora está um homem procurando a senhora. O nome é uma embrulhada que não se entende, mas o jeito dele faz pensar que bem pode ser o próprio Jesus!

Quando soube que seu pai se convertera, voltou à índia e ficou em sua casa alguns dias, em repouso. Mas seu coração estava sempre voltado para o Tibete. Dias depois, tentou novamente voltar àquele país, porém perdeu-se no caminho.

A neve ofuscante quase o cegou e ele voltou para casa, doente. Restabelecido, tentou outra vez. Caiu no meio do caminho e foi trazido novamente para casa, por viajantes tibetanos, quase morto.

O médico proibiu-o de fazer qualquer viagem. Ele passou a escrever, a orar e a meditar, passeando no jardim de sua grande casa.

Mas os frios ventos que sopravam no norte, vindos diretamente dos campos de neve do Himalaia, pareciam um gemido, uma súplica, pedindo-lhe que avançasse, pedindo- lhe que fosse novamente levar a Palavra de Cristo ao povo do Tibete. Em uma das rotineiras visitas do seu médico, Sundar Singh disse-lhe:

- Não posso enfraquecer o espírito com esta vida aqui. Devo dar-lhe uma explicação mais completa, doutor: afinal de contas, por que apegar-me-ia eu à vida? Estou bastante forte para viajar de novo e, se necessário, morrer por Jesus.
O médico nada pôde fazer para que ele desistisse daquela viagem.

- Voltarei de novo no outono, se tudo for bem, disse ele, ao se despedir.

Desaparecido no Himalaia

E foi. E nunca mais voltou. Não encontraram o seu corpo em parte alguma. Não houve notícia de que tenha cruzado com algum viajante ou que tivesse passado em algum lugarejo. E provável que o Himalaia seja hoje a sua sepultura.

Sobre o gelo, sangue: pés feridos em caminhos de brancura, rasgando o alvor da neve. A noite, o frio, o vento, a solidão, o gelo, o gelo, o gelo...

Rubros de sangue, violentados pelos climas glaciais, sobre as montanhas os pés de Sundar Singh deixaram um rastro vermelho, um doloroso rastro de sacrifício pelo Evangelho, testemunho vivo dos caminhos de luz que conduzem a Jesus Cristo e às Planícies da Paz.

Ó vós que na Índia, sobre o Himalaia, no Tibete ou em qualquer outro vale de escuridão, trilhais os caminhos da morte... ouvi a voz desse que clamou sobre as montanhas, entre os viajores, nas aldeias, nas cidades, nos continentes, anunciando a Redenção.

Aquela voz que se perdeu entre os abismos frios; aqueles pés sangrentos que pela última vez pisaram a face da neve, vê-los-emos nas ruas da Jerusalém eterna, no dia em que, entre glórias e hosanas, contemplarmos no Céu a majestosa e serena face de Cristo!

Phonte: Jefferson Magno Costa

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