Se você quer ser um bom juiz, terá de se resignar ao fato de que você não vai gostar sempre das conclusões a que vai chegar. Se você gostar delas o tempo todo, provavelmente estará fazendo algo errado. Justice Antonin Scalia
Os ministros do Supremo Tribunal Federal alteraram nesta quarta-feira (17/02) a jurisprudência da corte e liberaram a prisão de condenados após a confirmação da sentença em segunda instância.
Ao analisar um pedido de habeas corpus que questionava a expedição de um mandado de prisão pelo Tribunal de Justiça de São Paulo sem que a sentença tivesse transitado em
julgado, o pleno do STF avaliou que a questão não fere o princípio constitucional da culpabilidade penal, alterando entendimento anterior da própria corte.
A decisão do STF foi comemorada na imprensa e no meio jurídico, já que esta seria a norma na maioria dos países desenvolvidos, além de ir ao encontro do entendimento do juiz Sérgio Moro, para quem o antigo processo favorecia a impunidade.
julgado, o pleno do STF avaliou que a questão não fere o princípio constitucional da culpabilidade penal, alterando entendimento anterior da própria corte.
A decisão do STF foi comemorada na imprensa e no meio jurídico, já que esta seria a norma na maioria dos países desenvolvidos, além de ir ao encontro do entendimento do juiz Sérgio Moro, para quem o antigo processo favorecia a impunidade.
Sem entrar no mérito da questão, o problema é que tal decisão está em desacordo com o estabelecido na alínea LVII do artigo 5º da Constituição, que proclama, in verbis:“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Traduzindo o jargão jurídico, a expressão “trânsito em julgado de sentença condenatória” quer dizer que não existem mais recursos possíveis.
No mesmo diapasão, poderíamos citar outra decisão controversa do STF: A legalização do casamento gay, que contraria o parágrafo terceiro do artigo 226 da CF, no qual podemos ler textualmente: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Ou seja, para o constituinte, a instituição do casamento estaria restrita à união entre homem e mulher.
Como eu disse, não é minha intenção aqui entrar no mérito daquelas decisões – com o qual tendo a concordar por princípio -, mas destacar que tais decisões extrapolaram as funções ordinárias daquele tribunal, ao invadir a seara de outro poder constituído. Em resumo, juízes são aplicadores e, quando for o caso, intérpretes da lei. Não são legisladores para decidir ao arrepio da lei.
A esse respeito, é sempre bom rememorar as lições e as lutas do recém falecido Juiz Antonin Scalia, um homem que, durante sua longa atuação na Suprema Corte americana, foi um intransigente defensor do texto constitucional, contra as interpretações descabidas e abusivas defendidas pelos adeptos de uma estrovenga teórica chamada de “Novo Constitucionalismo”. Em artigo para a Reason, o Juiz Andrew Napolitano resumiu a visão de Scalia em relação ao tema:
Na era pós Segunda Guerra Mundial, Scalia foi o defensor mais agressivo e consistente, na Suprema Corte, da primazia do texto da Constituição. Ele foi o pai moderno da ideia e, em última instância, da jurisprudência segundo a qual a interpretação da Constituição deve ser fiel ao claro significado de suas palavras. Tal teoria da interpretação constitucional envolve dois conceitos complementares: textualismo eoriginalismo.
Scalia argumentava que a Constituição significa o que ela diz. É, portanto, superior aos juristas que a interpretam. O que vale é o que está escrito, não o que alguns gostariam que lá estivesse. Com efeito, todos os juízes estão sujeitos ao seu texto. Daí o termo textualismo.
Segundo Scalia, as garantias constitucionais são reais. O exercício dos direitos ali articulados não pode ser objeto de concursos de popularidade. Por outro lado, se o texto da Constituição for eventualmente ambíguo, torna-se então dever do jurista determinar o significado original das palavras a fim de dissolver a ambiguidade. Daí o conceito de originalismo.
O contrário disso seria dar aos juízes o poder para interpretar a Constituição de maneiras novas e criativas, por vezes destrutivas, de acordo com suas próprias ideologias. Em outras palavras, adaptar o texto a seu bel prazer, para fortalecer atitudes sociais contemporâneas. Contra isso, Scalia era firme: o trabalho do juiz não é adaptar o texto da Constituição às tendências modernas ou às mudanças culturais. Esse é o trabalho do Congresso e dos legislativos Estaduais.
Para Scalia, a Suprema Corte representa a parte não democrática do governo. Seu dever é o de preservar as normas constitucionais, suas estruturas e garantias das interferências dos setores políticos do governo, mesmo quando esses setores têm franco apoio popular. Afinal, as duas principais serventias das constituições talvez sejam justamente delimitar o poder dos governos e garantir os direitos das minorias. (Eis aqui, portanto, o âmago do que se convencionou chamar de segurança jurídica.)
Os argumentos de Scalia em favor do textualismo / Originalismo, entretanto, não raro encontraram forte oposição na academia e no meio político, principalmente do lado progressista.
No mesmo diapasão, poderíamos citar outra decisão controversa do STF: A legalização do casamento gay, que contraria o parágrafo terceiro do artigo 226 da CF, no qual podemos ler textualmente: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Ou seja, para o constituinte, a instituição do casamento estaria restrita à união entre homem e mulher.
Como eu disse, não é minha intenção aqui entrar no mérito daquelas decisões – com o qual tendo a concordar por princípio -, mas destacar que tais decisões extrapolaram as funções ordinárias daquele tribunal, ao invadir a seara de outro poder constituído. Em resumo, juízes são aplicadores e, quando for o caso, intérpretes da lei. Não são legisladores para decidir ao arrepio da lei.
A esse respeito, é sempre bom rememorar as lições e as lutas do recém falecido Juiz Antonin Scalia, um homem que, durante sua longa atuação na Suprema Corte americana, foi um intransigente defensor do texto constitucional, contra as interpretações descabidas e abusivas defendidas pelos adeptos de uma estrovenga teórica chamada de “Novo Constitucionalismo”. Em artigo para a Reason, o Juiz Andrew Napolitano resumiu a visão de Scalia em relação ao tema:
Na era pós Segunda Guerra Mundial, Scalia foi o defensor mais agressivo e consistente, na Suprema Corte, da primazia do texto da Constituição. Ele foi o pai moderno da ideia e, em última instância, da jurisprudência segundo a qual a interpretação da Constituição deve ser fiel ao claro significado de suas palavras. Tal teoria da interpretação constitucional envolve dois conceitos complementares: textualismo eoriginalismo.
Scalia argumentava que a Constituição significa o que ela diz. É, portanto, superior aos juristas que a interpretam. O que vale é o que está escrito, não o que alguns gostariam que lá estivesse. Com efeito, todos os juízes estão sujeitos ao seu texto. Daí o termo textualismo.
Segundo Scalia, as garantias constitucionais são reais. O exercício dos direitos ali articulados não pode ser objeto de concursos de popularidade. Por outro lado, se o texto da Constituição for eventualmente ambíguo, torna-se então dever do jurista determinar o significado original das palavras a fim de dissolver a ambiguidade. Daí o conceito de originalismo.
O contrário disso seria dar aos juízes o poder para interpretar a Constituição de maneiras novas e criativas, por vezes destrutivas, de acordo com suas próprias ideologias. Em outras palavras, adaptar o texto a seu bel prazer, para fortalecer atitudes sociais contemporâneas. Contra isso, Scalia era firme: o trabalho do juiz não é adaptar o texto da Constituição às tendências modernas ou às mudanças culturais. Esse é o trabalho do Congresso e dos legislativos Estaduais.
Para Scalia, a Suprema Corte representa a parte não democrática do governo. Seu dever é o de preservar as normas constitucionais, suas estruturas e garantias das interferências dos setores políticos do governo, mesmo quando esses setores têm franco apoio popular. Afinal, as duas principais serventias das constituições talvez sejam justamente delimitar o poder dos governos e garantir os direitos das minorias. (Eis aqui, portanto, o âmago do que se convencionou chamar de segurança jurídica.)
Os argumentos de Scalia em favor do textualismo / Originalismo, entretanto, não raro encontraram forte oposição na academia e no meio político, principalmente do lado progressista.
Esta reação se uniu em torno de um conceito fluido e de amplo espectro interpretativo denominado “Constituição Viva“, segundo o qual os juízes não só podem como devem adaptar a Constituição às modernas preferências sociais e às necessidades governamentais. Para Scalia isso seria, em si mesmo, uma violação do juramento judicial de defender a Constituição como foi escrita, e não como alguns juristas desejariam que ela tivesse sido concebida.
Para Antonin Scalia, “as palavras têm uma gama limitada de significados, e nenhuma interpretação que vai além desse rol de significados é permissível.” Em outra sentença forte, ele disse: “Eu não acho que [a Constituição] seja um documento vivo, mas morto. Mais precisamente, eu acho que deve ser um documento duradouro, que não muda [ao sabor das paixões]. Eu acho que esta questão precisa ser tratada de forma ortodoxa.”
Nossos ministros do Supremo Tribunal Federal deveriam ler Antonin Scalia.
Para Antonin Scalia, “as palavras têm uma gama limitada de significados, e nenhuma interpretação que vai além desse rol de significados é permissível.” Em outra sentença forte, ele disse: “Eu não acho que [a Constituição] seja um documento vivo, mas morto. Mais precisamente, eu acho que deve ser um documento duradouro, que não muda [ao sabor das paixões]. Eu acho que esta questão precisa ser tratada de forma ortodoxa.”
Nossos ministros do Supremo Tribunal Federal deveriam ler Antonin Scalia.
Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal
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