Em meio a um grande debate nacional sobre o tema do aborto, o programa Fantástico, exibido pela Rede Globo, fez uma campanha aberta pela legalização da interrupção da gravidez. Dando destaque a uma pesquisa recente, ouviu especialistas e o ministro da saúde. Mas, o que realmente chamou a atenção foram os relatos de uma mulher que realizou o procedimento.
Para o telespectador comum, seria apenas mais uma matéria mostrando a necessidade de se regulamentar o aborto no país. Afinal, somente em 2015, meio milhão de brasileiras teriam feito um aborto ilegal. Ouvido, o Ministro da Saúde, Ricardo Barros, referiu-se à situação como “caso de saúde pública”. Já o criminalista Paulo Freitas diz que “a decisão do Supremo deve influenciar outros juízes na hora de julgar casos de aborto”.
Na próxima quarta-feira (7) o Supremo Tribunal Federal voltará a debater a questão do aborto. Julgará uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que descriminaliza o aborto para mulheres infectadas pelo vírus da zika, o que pode causar a microcefalia dos bebês. A tendência é que votam a favor, pois em setembro o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao STF parecer favorável. Em 2012, o STF havia legislado a favor do aborto nos casos de anencefalia do feto.
O Fantástico dedicou a maior parte do tempo da matéria ouvindo Debora Diniz, do instituto de bioética Anis e da UNB, que são os responsáveis pela pesquisa. Como ainda não foi publicada, nem está disponível no site oficial do Instituto, torna-se impossível uma análise mais detalhada.
Segundo o que foi mostrado na TV:
20% das mulheres brasileiras (entre 19 e 38 anos) teriam feito aborto
67% dessas mulheres já tinham filhos
88% tem religião
Não por acaso, a questão religiosa recebeu grande ênfase. Os apresentadores do programa dominical começaram a reportagem lembrando que o papa Francisco autorizou recentemente os padres a perdoarem as mulheres que praticaram aborto.
Ao dizer que as mulheres entrevistadas eram “cidadãs comuns”, Débora Diniz enfatizou que elas seriam “católicas e evangélicas”. Essa ênfase é relevante uma vez que são os parlamentares da Bancada Evangélica e Católica quem tentam barrar a legalização do aborto e até reverteram a decisão do STF.
Não por acaso, o Fantástico convenientemente ignorou o fato que a antropóloga é uma conhecida ativista pelo aborto, ou como ela prefere dizer, interrupção da gestação. Para ela e seus pares, um feto de até 3 meses não é um ser humano. Defensora da causa, ela escreve sobre o assunto em diversos jornais e liderou o grupo que entrou no Supremo para a descriminalização do aborto de anencéfalos e faz o mesmo para os casos de mães com zika. Dentro da abordagem do programa, não foi apresentado o contraponto, ou seja, alguém que se manifestasse contra.
Hoje, a estátua que representa a justiça e fica em frente ao Supremo Tribunal Federal amanheceu diferente. Ativistas insatisfeitos com a postura da Suprema Corte derramaram tinta vermelha em se colo e colocaram um bebê junto a ela, para simbolizar a decisão.
Segundo uma pesquisa do Datafolha divulgada no ano passado, 67% dos brasileiros são favoráveis à manutenção da lei atual sobre o aborto. Dezesseis por cento acreditam que o aborto deve ser permitido em outros casos e apenas 11% defendem que a prática deve deixar de ser crime em qualquer situação. Ao que parece, a Rede Globo continua empenhada em aumentar os índices de aceitação.
Assista:
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