Há exatos 73 anos o torpedeamento do navio brasileiro BAEPENDI levou o Brasil a sair de sua neutralidade para declarar guerra a Alemanha nazista e ao Eixo.
Por Sérgio Campregher –
Na noite do dia 15 de agosto de 1942, o BAEPENDI – navio de carga e de passageiros foi afundado pelo submarino alemão U-507, no litoral do estado de Sergipe.
Foi o décimo-sexto navio brasileiro a ser atacado (o décimo-quinto naquele ano), e o seu torpedeamento consistiu, até então, na maior tragédia brasileira na Segunda Guerra Mundial, com 270 mortos, sendo superado nessa estatística apenas pelo afundamento do cruzador Bahia, em 1945, no qual morreram cerca de 340 homens.
Embora o desastre com o cruzador tenha custado mais vidas, o torpedeamento do Baependi – e os que se seguiram nos dias seguintes – causou tamanha comoção nacional, que levou o país a sair da sua neutralidade formal para declarar guerra ao Eixo no final daquele mês de agosto de 1942.
Com efeito, sendo o ataque realizado a poucos quilômetros da costa, somado ao fato de que muitas das vítimas eram mulheres e crianças, a repercussão foi enorme. Nos dias que se seguiram, mais cinco navios seriam afundados pelo mesmo submarino, elevando o número de mortos à casa das seis centenas e enchendo as manchetes dos jornais com as fotografias chocantes dos mortos, que apinhavam as praias do sul de Sergipe e do norte da Bahia.
A consternação, seguida pela indignação, foi geral. A seqüência de torpedeamentos incendiou uma revolta que já atiçava a opinião pública. A situação política tornou-se tensa, com manifestações anti-fascistas em todo o país. Depredações contra estabelecimentos comerciais, cujos proprietários eram alemães ou italianos, tiveram início, bem como perseguições às pessoas originárias ou descendentes daqueles países.
Um grande comício no centro do Rio de Janeiro conduzido pelo o Ministro das Relações Exteriores, Oswaldo Aranha, levantou a população, que marchou até o Palácio da Guanabara e exigiu de Getúlio Vargas a declaração de guerra aos países do Eixo.
O presidente, sentindo que não podia postergar a decisão sob pena de minar as bases do Estado Novo, decidiu então assumir a liderança da reação nacional e, no dia 22 de agosto, depois de uma reunião com todo o ministério, declarou guerra à Alemanha e à Itália, formalizada no 31 de agosto de 1942, pelo Decreto-Lei nº 10.358.
ESTADO DE GUERRA LATENTE
Desde janeiro de 1942, não havia mais dúvida de que o Brasil alinhar-se-ia aos Estados Unidos na guerra contra o nazi-fascismo. E as palavras do embaixador alemão, dirigidas ao chanceler Oswaldo Aranha deixaram bem claro o que aconteceria se o Brasil rompesse relações com as potências do Eixo: “…significaria, indubitavelmente, o estado de guerra latente, acarretando provavelmente ocorrências que equivaleriam à eclosão da guerra efetiva”.
NAVIOS PINTADOS DE CINZA
Depois dos primeiros ataques, em fevereiro, o governo brasileiro, junto com autoridades navais norte-americanas, começou a tomar medidas para tentar evitar que os barcos fossem afundados tão facilmente. Assim, foi determinado que os navios fossem pintados de cinza e navegassem às escuras e sem bandeira.
Em meados daquele ano, os navios brasileiros começaram a ser dotados de um tímido sistema de defesa, dispondo tão-somente de uma peça de artilharia de 120 mm, o que se mostrou ineficaz ante aos ataques de surpresa feitos à noite, como aqueles que ocorreram no Mar do Caribe nos meses de junho e julho.
Quando em 24 de maio, o comandante do U-502 comunicou haver afundado no Caribe um navio mercante brasileiro que se encontrava artilhado – o Gonçalves Dias – e quando, em 27 do mesmo mês, o Ministro da Aeronáutica — Salgado Filho – anunciou com euforia que seus aviões atacaram sem declaração de guerra, submarinos do Eixo.
A Marinha alemã solicitou que fossem levantadas todas as restrições para ataques a navios brasileiros, no que foi imediatamente atendida. Daí por diante, os navios brasileiros seriam considerados beligerantes e torpedeados sem aviso.
O TORPEDAMENTO
Na tarde do dia 15 de agosto, o Baependi, comandado pelo Capitão-de-Longo-Curso João Soares da Silva, navegava a cerca de 20 milhas (aproximadamente 37 km) do litoral do estado de Sergipe, ao largo da foz do Rio Real, quando foi avistado pelo U-507. A navegação tão perto da costa fora uma orientação do Lloyd Brasileiro aos seus navios, temeroso das ações de submarinos hostis em alto-mar.
O navio havia saído de Salvador, Bahia, às sete horas da manhã, rumando para o norte, com destino a Maceió, sua próxima escala. Desaramado e com as luzes de navegação apagadas, singrava as águas do litoral nordestino a uma velocidade de 9 nós (16 km), num local em que a profundidade era de 40 metros. Do Rio de Janeiro, seu porto de partida, até a Bahia, o mar esteve calmo. Porém, desse ponto em diante, já se apresentava picado, espumoso, com fortes marolas. Levava a bordo 306 pessoas, incluindo a tripulação, de 73 homens, e uma unidade do Exército, cujos componentes — oficiais e soldados — iam acompanhados de suas famílias, algumas com muitas crianças, em um total de 233 passageiros, além de uma carga geral – material bélico incluso.
Às 19:12 hs o primeiro torpedo acertou em cheio o vapor. Foram 300 kg de explosivos — suficientes para afundar um navio de guerra — que atingiram a casa das caldeiras. Um segundo torpedo foi lançado em seguida justamente contra os tanques de combustível. Simultaneamente ao estampido, houve uma explosão que fez destapar a escotilha do porão nº 2 de onde passaram a sair grandes labaredas que subiam até quase o topo do mastro. Com isso o navio se incendiou, adernando rapidamente a boreste, lado pelo qual foi atingido.
O radiotelegrafista não teve tempo de transmitir uma mensagem de socorro. Também não houve tempo de lançar os botes e baleeiras ao mar; apenas uma se soltou espontaneamente. Muitos dos passageiros estavam em suas cabines e não tiveram tempo de sair devido à rapidez do afundamento. O navio levou dois minutos para submergir.
CONSEQUÊNCIAS
Além do capitão, morreram o imediato – aniversariante do dia -, o médico do navio, um piloto, cinco maquinistas, um radiotelegrafista e dois comissários e outros 43, totalizando 55 tripulantes perdidos, bem como 215 dos 233 passageiros que estavam a bordo. O major Landerico também morreu, junto com três capitães, cinco tenentes, oito sargentos e 125 cabos e soldados. Em nenhum outro torpedeamento houve tantas mortes.
Alguns náufragos conseguiram chegar à única baleeira que se soltou; 28 sobreviventes chegaram a terra na manhã do dia seguinte. Outros oito levaram mais um dia para chegar na praia, agarrados a destroços. No total, salvaram-se 18 tripulantes e 18 passageiros (somente uma mulher). Todas as crianças a bordo morreram. A notícia revoltou a população brasileira que, indignada e sedenta por vingança, se voltou contra imigrantes ou descendentes de alemães, italianos e japoneses.
Em muitas cidades brasileiras ocorreram episódios de depredações de estabelecimentos comerciais pertencentes a pessoas oriundas daqueles países, bem como tentativas de linchamento, mesmo contra aquelas não simpáticas à causa nazi-fascista, que eram a grande maioria.
O autor é Historiador.
Fonte: Pletz
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