SACERDOTISA Zenilda, na Igreja Batista Esperança, em Taguatinga, Distrito Federal. Desde 1980, ela esperava o reconhecimento do ministério feminino (Foto: Celso Junior/ÉPOCA)
A abertura da CBB às mulheres é importante em si mesma e pelo que representa no cenário religioso do país. Ela é o segundo maior grupo evangélico do Brasil, com 12.400 igrejas filiadas e cerca de 2,3 milhões de fiéis. Além de numerosa, a Igreja Batista exerce influência sobre outros grupos religiosos. A história dos batistas no Brasil remonta às missões americanas do século XIX. Eles exercem influência sobre outras igrejas históricas, como a presbiteriana e a metodista. Algumas práticas, como o batismo de adultos, e a doutrina, que prega que a salvação é alcançada pela fé, e não por uma predestinação divina, aproximam os batistas dos grupos pentecostais e neopentecostais
A Assembleia de Deus, maior denominação evangélica do país, foi fundada por dissidentes da Primeira Igreja Batista do Pará. Antes de fundar a Igreja Internacional da Graça de Deus, o missionário R.R. Soares frequentava uma Igreja Batista. “Hoje, as igrejas estão em permanente diálogo. Decisões como essa têm impacto sobre todos os grupos”, afirma Sandra Duarte de Souza, teóloga e professora da Universidade Metodista de São Paulo. O diretor executivo da CBB, Sócrates Oliveira de Souza, diz que, ainda nos anos 1970, a aceitação na Igreja Batista de divorciados influenciou outras igrejas evangélicas a fazer o mesmo.
Grande parte das religiões monoteístas do Ocidente tem ou já teve restrições ao papel da mulher. As igrejas evangélicas e a Igreja Católica são originárias do cristianismo primitivo. Acreditam que Jesus Cristo é filho de Deus e seguem a Bíblia como livro sagrado. Jesus tinha mulheres entre seus discípulos, mas escolheu 12 homens para ser seus apóstolos. O Evangelho de São Mateus diz: “Jesus reuniu seus 12 discípulos.
Conferiu-lhes o poder de expulsar os espíritos imundos e de curar todo mal e toda enfermidade. Eis os nomes dos 12 apóstolos: o primeiro, Simão, chamado Pedro; depois André, seu irmão. Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão. Filipe e Bartolomeu. Tomé e Mateus, o publicano. Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu. Simão, o cananeu, e Judas Iscariotes, que foi o traidor”. Nenhuma mulher é citada.
O debate mundial sobre a inclusão da mulher na alta hierarquia dos grupos religiosos só ganhou força a partir do século XX. Foi motivado menos por discussões de teólogos, dentro de seminários, e mais pela mobilização da mulher para ocupar espaços iguais aos do homem. Ainda hoje o tema rende polêmicas acesas entre os cristãos de diferentes denominações. No artigo “Ordenação feminina: o que o Novo Testamento tem a dizer?”, o teólogo presbiteriano Augustus Nicodemus Lopes divide as opiniões sobre a inclusão da mulher entre “diferencialistas” (contra) e “igualitaristas” (a favor). Os diferencialistas afirmam que homens e mulheres foram criados com papéis distintos e que cabe ao homem exercer autoridade em casa e na igreja. Buscam argumento em trechos da Bíblia , como a recomendação de São Paulo a Timóteo, um dos líderes do cristianismo primitivo: “Não permito que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o marido, mas que esteja em silêncio. Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”. Segundo Lopes, a referência de Paulo à narrativa do Gênesis para justificar a proibição à ordenação das mulheres revela a crença de que a mulher está mais suscetível ao erro religioso. A ordenação feminina, diz Lopes, é uma violação dos princípios que Paulo percebe na narrativa da criação do gênero humano e na queda do homem. Os igualitaristas são favoráveis à participação mais ativa da mulher nas religiões, por entender que as diferenciações resultantes do pecado original foram apagadas pelo sacrifício de Cristo. O argumento também está embasado nas palavras de São Paulo: “Não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”, disse aos gálatas. Além de buscar nas escrituras evidências de mulheres que ocupavam posições de destaque na igreja primitiva, como as profetisas citadas na Bíblia ou várias mulheres lembradas por São Paulo em suas cartas às igrejas, os defensores da ordenação de pastoras argumentam que o texto bíblico deve ser contextualizado.
Para a teóloga Sandra Duarte de Souza, os argumentos sociológicos atuais são legítimos, mesmo numa discussão religiosa. “Os argumentos contra as sacerdotisas só encontram acolhida hoje porque ainda vivemos numa cultura patriarcal”, diz. “A localização do texto bíblico em seu contexto histórico permite outras possibilidades de interpretação”, diz Breno Martins Campos, professor de pós-graduação em religião da PUC de Campinas, São Paulo.
TÃO PERTO, TÃO LONGE Ordenação em 1994 de 32 mulheres na Igreja Anglicana, a denominação protestante mais próxima dos católicos. O Vaticano resiste à abertura (Foto: Matthew Polak/Sygma/Corbis)
No século XX, as mulheres conquistaram espaços nas denominações evangélicas. Nas Assembleias de Deus dos Estados Unidos, a presença das mulheres nos púlpitos foi oficializada em 1935. Nas décadas seguintes, elas foram seguidas por metodistas, presbiterianos e luteranos. A experiência internacional inspirou as igrejas Metodista, Evangélica de Confissão Luterana e Presbiteriana Independente, no Brasil, a aceitar mulheres como pastoras. Nas igrejas pentecostais e neopentecostais, foram as cantoras gospel que mais contribuíram para aceitação do ministério feminino.
A visibilidade conquistada por cantoras como Ana Paula Valadão e Cassiane abriu espaço para que fossem nomeadas como pastoras por suas igrejas. Depois de Cassiane, todas as mulheres de presidentes da Assembleia de Deus Ministério Madureira passaram a ser ordenadas compulsoriamente. Estudioso das Assembleias de Deus, o sociólogo Gedeon Alencar diz que a prática não representa uma inclusão real, por excluir do sacerdócio as mulheres sem laço familiar com pastores. A teóloga Sandra discorda. Para ela, a ordenação de mulheres de pastores ajuda a mudar as concepções sobre o papel da mulher na igreja. Na Igreja Católica, a perspectiva da ordenação de mulheres ainda é distante. Quando a Igreja Anglicana – denominação protestante mais próxima dos católicos – passou a ordenar mulheres, em 1994, o papa João Paulo II divulgou uma Carta Apostólica para reafirmar que o ministério é reservado aos homens. O papa Francisco defende mais espaço para as mulheres no catolicismo, mas não no sacerdócio. “Devem ser valorizadas, não clericalizadas”, reafirma o papa, em meio a todas as suas promessas de renovação da Igreja Católica.
Fonte: Isto é
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