Traída por um trailer. Foi assim que me senti durante a
exibição de “Noé”, do cineasta Darren Aronofsky.
Quando vi o trailer, fiquei maravilhada. Os efeitos
especiais, o clima da época, a cena em que o líder dos inimigos diz a Noé: “
Tenho soldados à minha disposição e você sozinho me desafia?” Então, Noé,
confiante e tranquilo, responde: “Eu não estou sozinho.” – Uau! Há muito tempo
esperava uma superprodução das histórias maravilhosas do Antigo Testamento. Com
os recursos que temos atualmente, daria para fazer cenas grandiosas. Mas…era
tudo falso, meus amigos. Cada cena daquele trailer foi cuidadosamente montada
para enganar a mim e a você.
Não é nem questão de o filme não ser fiel à Bíblia apenas. É
muito pior do que isso. Ele simplesmente conta outra história. Se fosse
considerar esse filme realmente como uma interpretação do texto de Noé, eu
diria que é uma versão satanista. E olha que não sou adepta de teorias
conspiratórias, e não saio por aí chamando qualquer coisa de satanista.
Segundo o filme, quando o Criador expulsou o homem do
Paraíso, após Adão e Eva terem desobedecido, um grupo de anjos, que sabia que
havia algo de bom no homem (afinal de contas, era a imagem do Criador), ficou
com pena da humanidade e resolveu descer para ajudar. O Criador, intolerante,
entendeu como traição e puniu aqueles anjos, condenando-os a morarem na Terra,
amaldiçoados.
Eles eram luz, mas a partir deste momento, se tornaram
gigantes de pedra, fisicamente deformados e tortos (algo como um cruzamento dos
Ents, do Senhor dos Anéis, com o monstro de pedra, de História sem Fim e algum
parentesco com um monstro de lava – todos em grave estado de desnutrição e com
problemas sérios de coluna), mas ainda gente boa. Ensinaram ao homem tudo o que
sabiam a respeito da Terra, porque eram bonzinhos e queriam ajudar. Se tornaram
os Guardiões e acolheram os filhos de Caim. Só que foram traídos e desprezados
pelos homens, que desvirtuaram o que aprenderam.
Siiim, meus amigos, os demônios, segundo esse filme, são
apenas seres bem intencionados que queriam ajudar… Na verdade, em todo o filme,
os únicos personagens que despertam alguma empatia no público são esses anjos
caídos. Estranho, não? A gente chega a sentir pena deles, pois parecem
injustiçados. São bons e simpáticos. Você percebe neles respeito por Deus (!!)
e os homens os chamam de “servos do Criador”. Essa perspectiva e a distorção do
caráter de Deus, do porquê ele escolheu Noé e a distorção do caráter dos
próprios demônios (que, na verdade, caíram porque foram egoístas e orgulhosos,
nunca tentaram ajudar ninguém), faz com que eu desconfie seriamente que o filme
foi inspirado por um demônio que queria se autopromover.
Como não se trata do Noé que a gente conhece, vou chamá-lo
de “Nãoé”. No início do filme, os filhos
de Caim matam o pai do pequeno Nãoé e roubam uma pele de cobra que ele usava
para fazer um ritual de “transferência do direito de primogenitura”, algo como
tornar-se protetor do meio-ambiente. Os filhos de Caim são malvados porque
exploraram os recursos naturais até que a terra se tornasse árida, comem carne,
vivem como seres bestiais famintos (isso eu não entendi. O lugar não tem
vegetais e os carnívoros é que passam fome?) e não têm educação.
Um dia, Nãoé sonha com gente morta debaixo dágua e entende
que o Criador destruirá o mundo. Sabe que tem que fazer alguma coisa, mas não
sabe o quê. Como viu também no sonho a montanha em que mora (sozinho) o avô
Metusalém, segue para lá com a família. No caminho, encontra um vilarejo
destruído e uma menina ferida, Illa, quase da idade de seu filho Sem (todos os
filhos de Nãoé são pequenos). Adota a menina. Na estrada, também encontram os
demônios gigantes de pedra com problemas de coluna. Desconfiadas, as criaturas
não aceitam ajudar a família e deixam todos em uma vala. No entanto, um gigante
com cara de dó volta durante a madrugada para ajudá-los a escapar e segue com
eles até a montanha.
Vovô Metusalém é uma espécie de bruxo ou xamã. Dá um
chazinho alucinógeno para Nãoé, que vê a arca. (Não é Deus que fala com Noé, é
o alucinógeno de Metusalém.) Ele também dá uma semente mágica do Éden a Nãoé,
que a planta na terra seca. Essa semente é tipo um feijão mágico vitaminado.
Quando os outros demônios vêm levar o demônio traidor, entendem que Nãoé
realmente falou com o Criador e resolvem ajudar. Uma floresta cresce em cinco
minutos (super feijão mágico) e Nãoé vê ali a madeira para a sua arca. Mãos à
obra! A família começa o trabalho, mas quem realmente faz a arca é o diabo e os
demônios! Em dez anos, concluem o trabalho. (Na Bíblia levou cem anos, mas no
filme, com a ajuda dos demônios, apenas dez.)
Nãoé se convence de que nenhum humano merece viver, nem
mesmo sua família. Começa a se tornar egoísta e fanático. Se despersonaliza e
agora acredita que a missão deles é salvar os animais, que são inocentes, e
manter a Terra limpa dos humanos. Humanos, a sujeira do universo. Ele não é
escolhido pelo criador por ser bom, mas por ser obsessivo o suficiente para
completar a tarefa. Enquanto no original:
“Disse o SENHOR a Noé: Entra na arca, tu e toda a tua casa,
porque reconheço que tens sido justo diante de Mim no meio desta geração.”
(Gênesis 7.1)
O filme tenta distorcer a noção de “justo” e “justiça”,
usando essas palavras fora de contexto diversas vezes, para tentar transformar
Noé e Deus em algo que eles nunca foram. Imagino que possa causar confusão na
mente de pessoas que não têm muita noção de quem Deus é e se sentem perdidas em
um mundo com tanta maldade e injustiça. Sutilmente elas serão levadas a uma
interpretação distorcida da mensagem original.
Arca pronta, os animais começam a entrar e são colocados
para dormir com uma fumaça-sonífero. Aí, vamos ao anticlímax total: lembra
daquela cena do Trailer? Aquela que eu achei superforte, em que o líder dos
inimigos diz a Noé: “Tenho soldados à minha disposição e você sozinho me
desafia?” Então, Noé, confiante e tranquilo, responde: “Eu não estou sozinho”.
Pois é…no trailer parecia que ele estava falando de Deus. No
filme, quando ele diz isso…adivinha? Se levantam atrás dele todos aqueles
demônios de pedra. Só pode ter sido de propósito. Quem quer que tenha montado
aquele trailer estava realmente a fim de fazer uma piadinha de mau gosto.
Nem a narrativa presta. O filme tem muitas cenas inúteis e
sem noção. Por exemplo, em um momento que deveria ser tenso, quando Cam foge
para procurar uma esposa justo na hora de fechar a arca, Illa (namorada/esposa/irmã
adotiva de Sem) sai atrás de Cam e encontra o vovô Metusalém na floresta. Ele
dá um passe que a deixa com dor de barriga e meio ninfomaníaca. O mundo está
acabando, mas Ila ataca Sem no meio do caminho, totalmente sem noção do momento
ideal (e do local apropriado) para se fazer as coisas (sério, ela começa a
beijar ele e você entende que vão tirar a roupa ali mesmo…).
O diabo (líder dos demônios) morre defendendo a arca, pede
ao Criador que o perdoe, vira novamente um anjo luminoso e vai para o céu
(momento piada que me fez rir), enquanto o outro (que tem cara de coitadinho)
diz, com voz abobalhada: “o Criador levou ele para casa!” Então…todos eles
querem defender a arca para serem levados de volta para o céu…e, de fato, são.
Quer dizer, o diabo é bom, Deus não está nem aí para ninguém (além de ser
psicopata, está muito, muito longe. Não dá para contar com Ele) e o homem é que
é ruim. No filme, não tem como se livrar do mal, pois ele está dentro do ser
humano. A saída? Não dá para entender racionalmente, não. Tem a ver com
amor-sentimento e se deixar levar pelo coração. Bela pregação do inferno e
completamente contrário ao que a gente acredita.
Dentro da arca, a família infeliz ouve os gritos das pessoas
lá fora e insiste com Nãoé para resgatá-las, pois são pobres pessoas inocentes
e famintas (manipulação emocional descarada).
“Viu o SENHOR que a maldade do homem se havia multiplicado
na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração” (Gênesis
6.5) Ou seja, não eram homens famintos buscando comida. Não eram pessoas
inocentes, coitadinhas, ignorantes cujo maior erro era comer animais. Não eram
pobres criaturas injustiçadas. Era continuamente mau todo desígnio do seu
coração. Todo desígnio do coração. De todo mundo, exceto Noé. Como eles iam se
arrepender? Como poderiam mudar se não conseguiam enxergar seu erro? E,
versículos 7 a 9:
“Então, se arrependeu o SENHOR de ter feito o homem na
terra, e isso Lhe pesou no coração. Disse o SENHOR: Farei desaparecer da face
da terra o homem que criei, o homem e o animal, os répteis e as aves dos céus;
porque me arrependo de os haver feito. Porém Noé achou graça diante do SENHOR.
Eis a história de Noé. Noé era homem justo e íntegro entre os seus
contemporâneos; Noé andava com Deus.”
A ideia não era extinguir o homem, mas começar de novo. Deus
escolheu Noé porque ele era diferente do restante da humanidade. E decidiu destruir
o resto porque, entenda: pessoas vivendo na maldade e na injustiça já estavam
mortas diante dEle. Apenas oficializaria sua condição.
Algum tempo depois, Ila descobre que está grávida ao cuspir
em uma folhinha mágica…tipo um teste de farmácia pré-diluviano…hahaha… O
problema é que Nãoé está convencido de que o criador quer exterminar sua
família (Nãoé não leu a Bíblia). A notícia estraga o plano perfeito para a
extinção da humanidade. Ele fica revoltado e tem mais um surto psicótico.
Acredita que o Criador quer que ele mate o bebê, se for menina, para evitar que
faça mais homenzinhos.
Obviamente, como o leitor já adivinhou, vai ser menina. Mas
a partir daí o filme vira um dramalhão mexicano, com tentativas de manipulação
emocional e tom sombrio, com Nãoé piradão andando pela arca com cara de
psicopata e sua esposa magoada e histérica. Não há fé ou demonstrações de
grandeza interior. E o Deus do filme é totalmente ausente, omisso, intolerante
e cruel. Mais ou menos o que pensam dEle os que interpretam a Bíblia de modo
raso e infantil.
Resumindo, Illa entra em trabalho de parto e tem gêmeas. Na
hora em que vai esfaquear a cabeça das criancinhas, Nãoé sente amor no coração
e o amor vence o ódio. O ódio, no caso, era a ordem do “criador”. Quando
resolve desobedecer, Nãoé consegue ser sensato. (oi?)
Mesmo com o conflito resolvido, ao sair da arca, ninguém
mais é feliz, nem inocente. Todo mundo matou ou pensou em matar. Não fala de
aliança entre Deus e a humanidade, a mensagem original não é passada, o sentido
original é distorcido. A história linda descrita nos capítulos 6, 7, 8 e 9 de
Gênesis foi transformada em uma palhaçada. Gastaram milhões para enganar os
espectadores e fazer uma babaquice pior do que Transformers. Mas dá dinheiro, e
isso é o que Hollywood quer. Em um mundo onde o ceticismo burro impera e é fora
de moda dizer que acredita em Deus, “Noé” consegue a proeza de enganar cristãos
e ateus. Os primeiros, vão assistir por achar que é um filme espiritual. Os
outros, vão assistir achando que não é espiritual.
O filme termina, sem que você tenha muita ideia de qual foi
a intenção. Um sermão ecológico sobre não destruir os recursos naturais e se
manter vegano mesmo no deserto? Uma discussão existencialista sobre “o ser
humano merece viver?” Um filme de ficção com batalhas sem graça e personagens
rasos? Um filme de terror com sangue espirrado, corpos em estado de putrefação
e homens bestializados matando e morrendo por fome? Uma novela mexicana?
Um filme sem graça e mal escrito, pesado e arrastado, com
personagens rasos e histórias ridículas. Há quebra de ritmo em diversos pontos
e o personagem principal fica doido de uma hora para outra. É risível. Meu
marido comentou que apenas dois filmes fizeram com que ele tivesse vontade de
sair do cinema antes de terminar. Noé e “The Fountain”. Por coincidência, ambos
de Darren Aronofsky. Cansativos, pretensiosos, arrastados, emocionalmente
carregados e com tendências ecologico-newage-existencialistas.
O “Noé” do filme não tem nada a ver com o personagem original;
o Deus do filme não tem nada a ver com o Deus da Bíblia, a história do filme
não tem nada a ver com a história da Bíblia. O roteiro é tão ruim que precisou
de um trailer-isca para enganar os incautos. Quero ver se pegassem um livro do
Tolkien e fizessem uma distorção desse nível. A essa altura você teria uma
porção de nerds dilacerando o roteirista e organizando boicotes em massa. Nunca
mais o estúdio se atreveria a fazer algo parecido. O pessoal já ficou indignado
porque no segundo filme do “Hobbit” acrescentaram uma personagem que não
existia no livro! Imagina se alterassem toda a história, personalidade e
caráter de absolutamente TODOS os personagens? O trabalho foi malfeito, mesmo.
Eu me senti enganada, traída e assaltada.
Para mim, o verdadeiro roteirista desse filme (por trás do
ser humano) foi o mesmo espírito que falou com o amigo perturbadinho de Jó…
“Uma palavra se me disse em segredo; e os meus ouvidos
perceberam um sussurro dela. Entre pensamentos de visões noturnas, quando
profundo sono cai sobre os homens, sobrevieram-me o espanto e o tremor, e todos
os meus ossos estremeceram.
Então, um espírito passou por diante de mim; fez-me arrepiar
os cabelos do meu corpo; parou ele, mas não lhe discerni a aparência; um vulto
estava diante dos meus olhos; houve silêncio, e ouvi uma voz: Seria,
porventura, o mortal justo diante de Deus? Seria, acaso, o homem puro diante do
seu Criador? Eis que Deus não confia nos seus servos e aos seus anjos atribui
imperfeições; quanto mais àqueles que habitam em casas de barro, cujo
fundamento está no pó, e são esmagados como a traça! Nascem de manhã e à tarde
são destruídos; perecem para sempre, sem que disso se faça caso. Se se lhes
corta o fio da vida, morrem e não atingem a sabedoria.” (Jó 4.12-21)
E:
“Que é o homem, para que seja puro? E o que nasce de mulher,
para ser justo? Eis que Deus não confia nos seus santos; nem os céus são puros
aos Seus olhos, quanto menos o homem, que é abominável e corrupto, que bebe a
iniquidade como a água!” (Jó 15.14-16)
Esse é o espírito que ajudou a escrever o roteiro de “Noé”.
Não é um raciocínio muito semelhante? A forma de distorcer as coisas, dizendo
que o diabo não é mau, Deus é que atribui imperfeição a tudo! E o ser humano é
um nada, pó, ridículo e desprezível. Essa é a visão do diabo, não de Deus.
O objetivo de Deus sempre foi conseguir uma forma de redimir
a humanidade, a quem Ele ama e sempre amou. O diabo nos despreza e sente
profunda inveja porque Deus deu ao homem o privilégio de ser chamado Seu filho
e de cuidar de tudo o que Ele fez. Se alguém tivesse clamado, querendo ouvir a
Deus, como o chefe malvado fez em certo momento do filme, certamente ele não
teria ficado de fora.
“Desviando-se o justo da sua justiça e praticando
iniquidade, morrerá nela. E, convertendo-se o perverso da sua perversidade e
fazendo juízo e justiça, por isto mesmo viverá.” (Ezequiel 33.18,19)
O filme não mostra as falas maravilhosas de Deus, seu amor
pela humanidade, sua misericórdia, sua aliança com Noé… além de destruir a
imagem de Deus e o que Ele pensa da humanidade, faz parecer que obedecer a Deus
é algo ruim, que transforma homens pacatos em psicopatas…
Espero que esse texto ajude a evitar que você gaste seu
suado dinheirinho com algo que não vale nem um centavo, principalmente por
passar uma mensagem mentirosa. E espero que evite que você gaste duas horas e
meia de sua vida com uma bobagem desse nível. O alerta é para que ninguém mais
seja enganado como eu fui. Há uma diferença enorme entre um filme que assume
que é mera ficção, fantasia, e um filme que finge ser uma coisa no trailer e é
outra na exibição.
Por Vanessa Lampert
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Faça um blogueiro feliz, comente!!
Porém...
Todo comentário que possuir qualquer tipo de ofensa, ataque pessoal e palavrão, será excluído sem aviso prévio!